Monteiro Lobato e o Governo Brasileiro

Depois de ter sido preso pelo “crime de sinceridade” — escrevera uma carta esperançosa ao Getúlio Vargas cheia de conselhos e reclamações contra o Conselho Nacional de Petróleo –, Monteiro Lobato finalmente perdeu as esperanças para com o futuro do Brasil sob tão terrível governo — o qual, de lá pra cá, vale lembrar, não mudou quase nada.

Já nos anos 1920, o escritor criticava os “trinta governos militares”, que sobrevinham um após o outro desde 1889, e o perene estado de sítio que o Brasil vivia. Falava dos impostos absurdos que sangravam a indústria, o comércio, sua própria editora (na qual investira todo o dinheiro da venda da fazenda que herdara) e que, enfim, matava o produto brasileiro que se via assim impedido de competir com os produtos estrangeiros. (Um livro português era mais barato que um livro — em branco!!! — feito no Brasil.) Ficou horrorizado quando o Poço Lobato, na Bahia, primeiro jorro de petróleo em terras brasileiras, graças à iniciativa privada, foi fechado pelo governo — o qual aliás havia declarado que naquela região não havia hidrocarbonetos — tendo sido, em seguida, “enfeitado” com um obelisco e os dizeres: “O Primeiro Campo Onde Jorrou Petróleo no Brasil – Organização do Conselho Nacional do Petróleo no Governo do Dr. Getúlio Vargas”. Ao acusar na referida carta semelhante roubo estatal, Lobato foi preso. Anos mais tarde, descobriu que a Standard Oil Company, dos Rockefeller, — impedida por lei (norte-americana, claro) de dominar a extração de petróleo nos EUA — já havia mapeado desde o início do século todas as áreas petrolíferas do Brasil, e por isso subornava nossos políticos para manter o monopólio, se não lá, ao menos nestas bandas, nesta terrinha subdesenvolvida com mais políticos corruptos por metro quadrado. Assim, enquanto nos EUA a prosperidade se espalhava com a abertura de poços de petróleo particulares numa taxa de 20 mil ao ano — desde meados do século XIX — no Brasil, o primeiro poço era então tomado pelo governo e os demais impedidos de funcionar por contradições legais: enquanto uma lei do famigerado Conselho proibia estrangeiros de participar como acionistas das companhias petrolíferas nacionais — e para ser considerado um estrangeiro bastaria possuir um sobrenome de origem estrangeira — um artigo da Constituição proibia os diretores de empresas de excluir sócios devido à sua nacionalidade… Logo, a burocracia local — aliada à safadeza de capitalistas selvagens estrangeiros — travou nossa livre iniciativa, o nosso capitalismo autóctone. (Não é à toa que o corolário de todo esse processo, a Petrobrás, seja aquilo que é: uma financiadora de politiqueiros malandros.)

Em 1932, quando os paulistas tentaram se livrar da opressão do governo federal, a cidade de São Paulo foi bombardeada por tropas legalistas. Segundo Lobato, morreram mais civis e foram destruídas mais casas em São Paulo, durante esse bombardeio, do que em Paris, na Primeira Guerra, que recebeu canhonaços alemães. Dizia o telegrama presidencial: “S.Paulo desrespeitou o princípio da minha autoridade; que S.Paulo deixe de existir”. Não fosse o milionário paulistano Macedo Soares — hoje nome do trecho que une a Marginal Tietê à Marginal Pinheiros — e os paulistas teriam perecido de fome, frio e sede. Soares bancou tudo, comida, água, cobertores, roupas, abrigos para os feridos e desalojados. O governo? O governo mandava balas e bombas sobre a população.

No artigo Os tratados com a Bolívia, Lobato finalmente desabafa e joga a toalha:

Chega. Não quero nunca mais tocar neste assunto de petróleo. Amargurou-me doze anos de vida, levou-me à cadeia — mas isso não foi o peor. O peor foi a incoercível sensação de repugnância que desde então passei a sentir sempre que leio ou ouço a expressão Governo Brasileiro

Hoje em dia, após tantas revelações de corrupção, crimes vários e o escambau, quem não sente a mesma repugnância só pode ter um motivo: foi comprado. “Ah, para que me indignar? Estou ganhando mesmo.” Sim, está ganhando. Está ganhando uma vaga no colinho do capeta…

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Assista a uma entrevista, no rádio, com Monteiro Lobato:

Primeira parte:

Segunda parte:

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